A participação de menores de idade no quadro societário de empresas é um tema que desperta muitas dúvidas entre empresários, advogados e familiares que desejam inserir filhos em negócios familiares ou planejar sucessões.
A seguir, analisaremos as regras legais e práticas mais relevantes.
1. O que é um sócio e a possibilidade de menores em sociedades limitadas
O sócio é a pessoa — física ou jurídica — que aporta recursos (em dinheiro, bens ou direitos) para a formação do capital social de uma empresa, adquirindo, em troca, direitos e deveres relacionados à atividade empresarial.
Assim, qualquer pessoa que possua capacidade civil pode ser sócio. Mas e os menores de 18 anos? Sim, o Código Civil, em seu art. 974, deixa claro que menores podem figurar como sócios, desde que observadas algumas ressalvas, quais sejam:
Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança.
[…]
§ 3º O Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais deverá registrar contratos ou alterações contratuais de sociedade que envolva sócio incapaz, desde que atendidos, de forma conjunta, os seguintes pressupostos:
I – o sócio incapaz não pode exercer a administração da sociedade;
II – o capital social deve ser totalmente integralizado;
III – o sócio relativamente incapaz deve ser assistido e o absolutamente incapaz deve ser representado por seus representantes legais.
Portanto, o menor pode sim figurar como sócio de uma LTDA, desde que respeitados os requisitos legais acima mencionados.
2. Menor absolutamente incapaz e relativamente incapaz: como se qualificam na prática societária
O Código Civil, arts. 3º e 4º, distingue duas categorias:
- Absolutamente incapazes (art. 3º, I): menores de 16 anos (até o dia anterior ao do aniversário de 16 anos).
- Nesses casos, o menor deve ser representado integralmente pelos pais ou tutor.
- Exemplo prático no contrato social, se representado por seus genitores: “Fulano de Tal, menor de 14 anos, neste ato representado por seus pais (qualificar ambos)…”
- Relativamente incapazes (art. 4º, I): maiores de 16 e menores de 18 anos (inclui o dia do aniversário de 16 anos, até a véspera de completar 18 anos ou serem emancipados).
- Devem ser assistidos pelos pais ou tutor.
- Exemplo prático no contrato social: “Fulano de Tal, menor púbere de 17 anos, assistido por seus pais (qualificar ambos)…”
Importante ressaltar que ambos os genitores assistem ou representam seus filhos, precisando da assinatura de ambos no documento societário, a menos que haja justificativa formal pela ausência de um deles, conforme estipula o Código Civil.
Art. 1.690. Compete aos pais, e na falta de um deles ao outro, com exclusividade, representar os filhos menores de dezesseis anos, bem como assisti-los até completarem a maioridade ou serem emancipados.
Parágrafo único. Os pais devem decidir em comum as questões relativas aos filhos e a seus bens; havendo divergência, poderá qualquer deles recorrer ao juiz para a solução necessária.
3. O prazo prescricional de 4 anos após atingir a maioridade ou ser emancipado
Um ponto crucial muitas vezes esquecido diz respeito ao direito do menor, ao atingir a maioridade (18 anos), ou de quando cessar eventual incapacidade, de anular os atos praticados em seu nome durante a incapacidade.
O art. 178, III, do Código Civil prevê o seguinte:
Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:
[…]
III – no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
Isso significa que, ao completar 18 anos ou cessar sua incapacidade, a pessoa terá 4 anos para questionar judicialmente qualquer ato que tenha sido praticado em seu nome, seja como sócio representado ou assistido.
Na prática, isso pode gerar uma zona de risco para os demais sócios, pois a sociedade pode enfrentar contestações futuras caso os representantes do menor tenham agido de forma irregular.
4. A responsabilidade dos pais ou tutores: quando respondem em excesso
Ao representarem ou assistirem o menor em atos societários, os pais ou tutores têm o dever de agir dentro dos limites legais e do interesse do incapaz.
Se ultrapassarem tais limites — por exemplo, integralizando capital em valor desproporcional, assumindo obrigações prejudiciais ou omitindo cláusulas importantes —, responderão pessoalmente pelos excessos cometidos.
O art. 932, I e II, do Código Civil estabelece que os pais, e tutores nas mesmas condições, respondem pelos atos dos filhos menores/tutelados que estiverem sob sua autoridade.
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; […]
Em complemento, o art. 1.634, VII, do Código Civil confere aos pais a administração dos bens dos filhos menores, mas dentro de limites razoáveis.
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
[…]
VII – representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; […]
Assim, se praticarem atos que venham a ser contestados pelo filho ao atingir a maioridade, poderão ser responsabilizados civilmente, reparando eventuais prejuízos.
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos. (Código Civil)
5. Conclusão
A participação de menores em sociedades limitadas é juridicamente possível, desde que observados os limites da legislação.
Portanto, admitir um menor como sócio pode ser uma estratégia legítima em casos de planejamento patrimonial ou sucessório, mas exige cautela, transparência e rigor formal para que a operação seja válida e segura a longo prazo.
Artigo de Rafael Borgert, disponível em Jusbrasil.